12/07/2016
O modo de fazer empreendedorismo mudou nos últimos anos. A maior empresa do mundo em transporte pessoal, o Uber, não possui veículos próprios. O Airbnb, considerado referencial em acomodações e hospedagem, não tem nenhum hotel. Até mesmo o Facebook, que se tornou a rede de comunicação mais popular do planeta, não produz conteúdo próprio. Todas essas companhias começaram como startups – empresas que no início das suas atividades desenvolvem produtos ou serviços inovadores com alto potencial de crescimento.
No Brasil, existem mais de 10 mil empresas com esse perfil, conforme o levantamento da Anjos do Brasil – associação de reúne investidores –, com recursos que já totalizam R$ 450 milhões, vindos de 5.300 investidores. A projeção do setor é que será possível multiplicar esse potencial no país, chegando a mais de R$ 5 bilhões de investimentos e 50 mil investidores nos próximos anos. Contudo, para esse cenário ser alcançado, será necessário um ambiente de negócios e regulatório menos hostil para empreendedores e investidores.
Dados da Global Innovation Index – ranking mundial de países inovadores – avaliaram o ambiente de negócios do Brasil com a nota 1,4, numa escada de zero a 100. Em inovação, ficou em 70º lugar, entre 141 países. Além disso, apenas 2% das empresas nacionais fazem de fato inovações que sejam utilizadas pelo mercado. Quando se trata de mercado internacional, esse percentual diminui para menos de 1%.
“A percepção que se tem no Brasil de burocracia e regulamentação governamental é muito complicada e hostil para que o empresário possa trabalhar. Há várias ideias, vários talentos, mas na hora de colocar em prática, empaca no ambiente de negócios, que não permite que esses startups avancem”, avaliou o superintendente do Instituto Euvaldo Lodi (IEL) e representante da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Paulo Mol.
Segundo o vice-presidente da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec), José Aranha, o Brasil é o país que menos tem inovação em seus empreendimentos, uma barreira que precisa ser quebrada. “Temos bons empreendedores, mas baixa inovação. Para chegarmos um dia ao patamar do Vale do Silício, precisamos, no final das contas, de duas variáveis: cérebros e dinheiro. Cérebros nós temos, mas uma forma de angariar recursos é um obstáculo que persiste”.
Como startups são consideradas empreendimentos de alto risco, pois nove em cada 10 não sobrevive no mercado, segundo as estatísticas globais, Aranha acredita que o apoio e facilidade ao capital de risco é fundamental para despontar esse setor. “Com isso, é possível ter países como Israel, que no meio do deserto, cercado de guerra, consegue desenvolver as tecnologias mais competitivas do mundo. Acredito que as startups podem ser a grama que crescerá por cima desse cenário de terra arrasada que se tornou a economia brasileira”.
Mudanças
Para o representante do Anjos do Brasil, Humberto Matsuda, é necessário um ecossistema de inovação e um ambiente regulatório que favoreçam os investidores das startups. “Vejo que falta uma cultura empreendedora no país, um pouco de regulação, um pouco mais de qualificação em inovação e tecnologia, e oportunidade para investidores aplicarem recursos”, comentou.
Como somente 10% das startups tem probabilidade de dar certo, as chances dos negócios não prosperarem são grandes. Matsuda recomenda que o ambiente de negócios estimule o investimento, seja com benefícios fiscais governamentais ou maior segurança jurídica. “Se queremos que nossos empresários invistam, independente do risco, é preciso ter um ambiente de negócios favorável, com regras simples e claras, que não os penalizem em caso de falência das startups”.
De acordo com o empreendedor Rodrigo Afondo, 21% do Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos é gerado por empresas que foram apoiadas por fundos de investimento de risco – que possuem uma alta taxa de perda. Afonso é diretor-executivo do Dínamo, grupo criado para articular políticas públicas para o sistema de inovação do Brasil. Segundo ele, as inovações trazidas pelas startups são o caminho para a melhora do cenário econômico.
“Nos EUA, as empresas novas foram responsáveis praticamente por 100% de todos os novos empregos entre 1977 e 2011. É uma mudança radical, como é possível ver pelo Uber ou o Airbnb. A tendência é diminuir cada vez mais esse cenário de grandes indústrias, fábricas com centenas de milhares de funcionários. Os novos empregos surgirão nessas novas empresas inovadoras”, informou.
Futuro
Conforme os dados da Associação Brasileira de StartUps (ABStartups), o empreendedorismo nesse seguimento pode representar 5% do PIB do país até 2035. “As startups são o futuro. O Brasil já tem seus exemplares, como a Simple, a maior empresa de venda de ticket de ingresso do país. Isso mostra que a inovação é hoje o maior veículo de ruptura que temos com o modelo antigo. A grande verdade é que nós geraremos os próximos empregos. Mas hoje, infelizmente, existe um isolamento claro das startups”, afirmou Amure Pinho, presidente da ABStartups.
Na visão do dirigente, a realidade das startups é tão diferente e particular que as regras e leis sobre empresas e mercado no país precisam se tornar especificas para esse seguimento. Por exemplo, com um marco regulatório, ou mesmo, normas menos burocráticas que prevejam a atuação diferenciada das startups.
“Seria quase que uma reforma empreendedora em leis, normas, desburocratização do sistema e do governo. Startups necessitam de agilidade, precisam se reinventar e de investimento de risco para dar suporte. Somos nichos diferentes, uma outra categoria, e precisamos de cuidados diferentes para gerar riqueza”, pontuou Pinho.
O tema foi discutido na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços da Câmara dos Deputados. Segundo o presidente do colegiado, deputado Otávio Leite (PSDB-RJ), será instituída na Casa uma Frente Parlamentar em defesa das startups brasileiras, incubadoras de empresas e aceleradoras.
(Leandro Cipriano, da Agência Gestão CT&I)