25/07/2017
Representantes das instituições da comunidade científica e acadêmica que participaram da construção do Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação (Lei 13.243/2016) criticaram, na última semana, em Belo Horizonte (MG), a demora na edição do decreto que regulamenta as novas regras para pesquisa e desenvolvimento (P&D) no país. Para os envolvidos, a finalização do arcabouço legal é fundamental para estabelecer um novo patamar na relação das entidades públicas, privadas e do governo federal na área de ciência, tecnologia e inovação (CT&I).
“É preciso definir com clareza as regras para que não haja problema depois”, resumiu Ângela Maria Cruz, presidente da Associação Nacional dos Dirigentes de Instituições Federais de Ensino Superior no Brasil (Andifes). “Lamento muito que há um ano e meio da sanção do Marco Legal, com todo o trabalho do MCTIC e das entidades, ainda esteja havendo divergência de algumas instâncias de governo para que esse regulamento seja publicado.”
As divergências citadas por Cruz são dos ministérios da Fazenda (MF) e do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG). As pastas econômicas do governo insistem em vetar o capítulo que regulamenta a Emenda Constitucional 85, que permite à área de CT&I fazer a transposição, remanejamento e transferência de verbas entre rubricas orçamentárias.
Para a presidente de honra da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena Nader, a tentativa de impedir a regulamentação da Constituição Federal não faz sentido. Nader lembrou que existem legislações locais, como a do estado de Minas Gerais. “A mudança de rubrica é do dia a dia dos mineiros. Por que não pode ser do dia a dia dos brasileiros?”, questionou.
Quem promoveu essa mudança em Minas Gerais também estava na mesa. Mario Neto Borges, na época presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e hoje a frente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), explicou como a regra simples de transposição de recursos funciona na Fapemig.
“O orçamento da Fapemig é 95% investimento e 5% custeio. E no investimento a única descrição é ‘apoio à pesquisa’. Dá para fazer”, confirmou o presidente do CNPq. O maior problema por trás da disputa entre ministérios em torno do Marco Legal, na visão de Borges, é a cultura burocrática. “Terminamos o marco, a Constituição está aí, a Lei está aí e o burocrata diz que não é bem assim”, reclamou.
Para o presidente do Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnológica (Confies), Fernando Peregrino, a situação vai além de uma mera teimosia burocrática. “Eles estão descontrolados. O que tenho observado é a degeneração da burocracia brasileira”, analisou.
O controle burocrático de todas as etapas do trabalho das instituições que trabalham com CT&I custa 35% do tempo de pesquisa. Sem contar as pesquisas que são paralisadas por questões administrativas, problemas que poderiam ser resolvidos com a regulamentação. “A transferência de recursos ainda é vista como improbidade administrativa”, confirmou Ângela Cruz.
Três pontos
Além de opor-se à maior liberdade de execução dos recursos, a Secretaria de Orçamento e Finanças (SOF) do MPOG é contrária à prestação de contas simplificada e à substituição do Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse (Siconv) na área de CT&I. Esses três itens são fundamentais para que a regulamentação possa efetivamente tornar a cadeia de P&D mais eficiente e produtiva.
“Esses três pontos, se não estiverem resolvidos adequadamente, é melhor não assinar. Porque [publicar o decreto] sem isso, vai ser uma bomba na comunidade científica”, sentenciou Mario Neto Borges.
Os especialistas discutiram durante o ciclo de debates da 69ª Reunião Anual da SBPC, na mesa “Novo Marco Legal da CT&I”.
(Agência ABIPTI, com informações do Jornal da Ciência)