01/11/2017
A busca por mecanismos para criar e internalizar propósitos na cultura organizacional é um desafio que tem mobilizado empresas de diferentes portes, segmentos e perfis. No Painel Purpose, que abriu as atividades do Palco Minas Digital nesta quarta-feira (1º de novembro), Vagas.com e Natura compartilharam suas experiências sobre inovação como propósito.
Para Mario Kaplan, fundador do Vagas.com – empresa digital que atua no segmento de recrutamento e seleção –, o grande diferencial da companhia está na construção de propósito para seus 150 colaboradores a partir de uma gestão horizontal, em que todas as decisões são consensuais. Mas como a empresa não poderia viver o tempo todo em reunião, foi criado um processo de construção de consenso.
“Até mesmo uma única pessoa pode decidir pelas outras 150. Quando se toma uma determinada decisão, ela é publicada na Intranet. Se ela for considerada errada por alguém, essa pessoa pode abrir uma controvérsia. Se a decisão for vista como correta, agimos de forma bem mais rápida que uma empresa vertical”, relatou Kaplan.
Questionado sobre a existência de hierarquias informais na Vagas.com, mais envolvidas com o processo de produção de consenso, Kaplan frisou que a companhia tem mais líderes do que uma empresa “normal”, mas não existe liderança delegada. “Existem lideranças informais, referências, e elas são valorizadas. Mas existe a possibilidade de criação da controvérsia”, afirmou.
O modelo de negócio da Natura, fundamentado em sua missão de promover o “Bem Estar Bem” integrando conhecimento científico e sustentabilidade, foi apresentado por Daniel Gonzaga, diretor de desenvolvimento de produtos da companhia.
Segundo o executivo, o foco da entrega de valor mudou do produto para o cliente e, mais recentemente, para o propósito. Hoje, o impacto transformacional sobre o planeta e o alinhamento com o cliente contribuem significativamente para o sucesso de uma empresa. “A Natura tem a sustentabilidade como propósito e busca transformar desafios socioambientais em oportunidades de negócios”, frisou, lembrando que 25% dos brasileiros têm cuidado e preocupação com a compra de produtos sustentáveis.
Conforme relatou Gonzaga, a Ucuuba, árvore que sofria risco de extinção pelo extrativismo predatório na Amazônia, foi estudada quanto ao potencial do uso de seu fruto na produção de uma manteiga ultra-hidratante e, então, passou a ser utilizada como matéria-prima pela Natura. “A população extrai e coleta o fruto para o nosso uso. A renda gerada para a comunidade é três vezes maior do que aquela resultante da extração predatória e venda da madeira”.
Adicionalmente, ele explicou que a empresa adota várias rotas para investigar novos ativos de potenciais, dentre as quais a etnobotânica. “Buscamos aprender com o conhecimento das comunidades e depois associar esse conhecimento ao nosso, para gerar inovação”.
O diretor de desenvolvimento de produtos também destacou algumas metas que fazem parte da visão de sustentabilidade da Natura, a serem atingidas até 2050. A expectativa é ter 86% das matérias-primas provenientes de fontes renováveis, gerar negócios de R$ 1 milhão na Amazônia e com mais de 10 mil famílias. “O que nos traz motivação para agir e criar está muito relacionado à obtenção de resultados diferenciados no mercado”, finalizou. Após o Painel Purpose, foram apresentados cases de sucesso da Bosch, Reciclapac, Smartoys e Eletrobrás Furnas.
Painel Hyperloop: O Futuro da Mobilidade
Um projeto de mobilidade intrigante foi apresentado no painel sobre o futuro da mobilidade, conduzido por Rodrigo Sá, Global Head of Business da Hyperloop Transportation Technologies. Trata-se de uma solução composta por cápsulas que se movimentam sem atrito e em alta velocidade, por levitação passiva magnética, dentro de um tubo. A proposta é que elas substituam os trens de alta velocidade, cujo uso exige a eletrificação de todo o trilho, resultando em altos custos com energia e manutenção.
Na comparação com os trens tradicionais, segundo Sá, a vantagem é que as cápsulas são capazes de transportar um volume maior de pessoas, em muito menos tempo e com um consumo bem menor de energia. “Quando ela começa a andar, e chega a cerca de 20 Km por hora, ela levita e não gasta praticamente nada de energia”, explicou o executivo, complementando que toda a energia utilizada será gerada a partir de placas solares instaladas na superfície do tubo, o que pode inclusive gerar excedente e recursos.
O modelo de como o projeto funcionaria foi colocado no papel por Elon Musk – da Tesla e SpaceX – em 2013. A ideia está sendo posta em prática a partir do crowdsourcing, com pessoas do mundo inteiro – dentre as quais cientistas e engenheiros da Nasa, SpaceX, Boeing e MIT – oferecendo suas horas de trabalho em troca de ações na empresa. Atualmente, a companhia conta com 820 colaboradores.
A Hyperloop já tem iniciativas em diferentes partes do mundo. No Brasil, a empresa pretende investir no transporte de cargas, um dos gargalos do país. Conforme destacou Sá, 43% dos acidentes que acontecem nas estradas brasileiras são com transporte de carga e o país perde US$ 1,6 bilhões de dólares por ano com roubos. “Estamos avaliando montar um Centro de P&D focado em carga no Brasil ou na Índia – estamos negociando com governos e devemos ter uma resposta até o fim do ano”, informou.
De acordo com Sá, a solução custa 1/3 do custo da construção de um trem de alta velocidade e o dispêndio com manutenção é bem menor. Além disso, como o sistema gera energia excedente que pode ser comercializada, o valor investido pode ser recuperado de 20 a 25 anos. “Estamos vendo uma nova indústria nascer do zero e isso é incrível, é uma oportunidade sem precedentes. É normal que alguns não acreditem, mas sempre foi assim na história. Nós acreditamos e está acontecendo”.
Painel Um Olhar para o Futuro
A atuação da FIAP, da loja colaborativa Mooca e da AbFintech pautaram o painel Um Olhar Para o Futuro. Guilherme Pereira, diretor da FIAP, falou sobre as ações da universidade e centro de educação focados em inovação, empreendedorismo e negócios.
“Tivemos que mudar nossa abordagem quando começamos a pensar no que os jovens que estão no Ensino Fundamental hoje serão no futuro. 60% das profissões dessas pessoas no futuro ainda nem existe. Assim, além da base curricular comum exigida pelo MEC, oferecemos aos jovens atividades de arte, programação, pensamento criativo, negócios e tecnologia”, salientou Pereira.
Sobre a graduação, ele relatou que as empresas levam desafios reais e os alunos desenvolvem soluções para esses problemas. Já na pós, foram criados os cursos de MBA em Inteligência Artificial, Negócios Digitais e Business Innovation. Para a conclusão de curso, agora os alunos têm a opção de criar uma startup ao invés de fazer um trabalho final. Muitas inspirações para as iniciativas da FIAP, segundo Pereira, vieram do Projeto Nômade, no qual foram visitados eventos e feiras de inovação em todo o mundo.
Já Fabiana, da Mooca, primeira loja colaborativa do Brasil com aceleração de produtos locais, contou como as economias colaborativa e criativa se misturam no seu negócio. A Mooca atua no desenvolvimento empreendedor de pequenos makers; auxilia na formação de redes por meio das quais eles fazem trocas entre si e se ajudam, realizando compras coletivas, por exemplo; e oferece marketplace, espaço físico que um maker sozinho não teria acesso. “Nossa metodologia consegue dobrar faturamento do maker local, fazer o pequeno ser tão relevante como o grande. Aceleramos 250 marcas locais”.
No fim do painel, Rodrigo Soeiro, fundador de uma Fintech, falou sobre as soluções de Inteligência Artificial que ela oferece para 17 bancos, dentre os quais Bradesco e BMG. Estamos mudando as relações das instituições bancárias no Brasil, as quais, até então, tinham seu setor intocado. Elas estão sendo levadas a refletir sobre como interagir melhor com seus clientes”.
Na percepção de Soeiro, o país tema a oportunidade de se tornar um celeiro de exportação de inovação sem depender do governo e sem fronteiras. A única questão é que precisamos de mindset, de acreditar em nós mesmos”, comentou ao final do painel, moderado Paulo Renato Cabral, sócio-diretor do Instituto Inovação.
Painel Minas Rumo ao Marco Legal de CT&I
No último painel da 16ª Conferência Anpei de Inovação, a secretária-adjunta de Casa Civil e de Relações Institucionais de Minas Gerais, Mariah Ferreira Brochado, abordou ações já desempenhadas e próximos passos rumo regulamentação do Marco Legal de CT&I do Estado.
Segundo Mariah, o projeto tramita na Secretaria Casa Civil e na SEDECTS-MG (Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Minas Gerais). “Constituímos comissão, resolução conjunta e viemos conduzindo discussões a propósito do nosso Marco, com a inclusão de direito de startups e Inteligência Artificial. Concluiremos os estudos até final de dezembro e esperamos ter, no ano que vem, o Marco Legal de CT&I de Minas”, frisou.
Complementarmente, Vinicius Rezende, Secretário da SEDECTS-MG, enfatizou a segurança jurídica é um dos pontos fundamentais para que o ecossistema de inovação avance. “Sempre fomos fortes em mineração e agronomia, mas é preciso investir na economia criativa com segurança e solidez para o desenvolvimento econômico do Estado”.
Fechando o painel, Níveo Ziviani, professor emérito do DCC-UFMG (Departamento de Ciência da Computação da Universidade Federal de Minas Gerais) e cofundador da Kunumi, falou sobre Empreendedorismo, Inteligência Artificial e Aprendizagem de Máquina.
Conforme ressaltou o professor, embora a produção científica brasileira tenha crescido muito nos últimos anos, ela não gera PIB na proporção que deveria. Além disso, enquanto nos Estados Unidos, por exemplo, a grande maioria dos pesquisadores fazem P&D na indústria, no Brasil, 80% é feita nas universidades e institutos públicos. Ziviani chamou a atenção para o caso da Universidade de Stanford, cuja receita anual das empresas dos alunos é de US$ 2,7 trilhões.
Em sua apresentação, o professor ainda esclareceu que o Aprendizado de Máquina dá aos computadores a possibilidade de aprender sem serem profundamente programados e abordou a sub-área de Redes Neurais Artificiais. Com Inteligência Artificial e as transformações que estão em curso, a estimativa é de que 1/3 dos empregos são hoje serão extintos até 2025, segundo a Ernst Young.
Cases de aplicações da Inteligência Artificial na área médica e das artes, a partir de soluções desenvolvidas pela Kunumi, também foram apresentados por Ziviani. A empresa desenvolveu um projeto para a área de UTIs do Hospital Israelita Sírio-Libanês. “O modelo auxilia na predição de mortalidade e na gestão da saúde. Ele permite ao médico intervir para salvar o paciente ou evitar que a pessoa vá para uma área crítica”.
Na área de Artes, a Kunumi fez uma parceria com Spotify para criar uma letra do artista já falecido Sabotage a partir de Inteligência Artificial. Desta forma, a música “Neural” teve um trecho todo composto pela rede neural, sem interferência humana.
Concluindo sua apresentação, o professor pontuou que a geração de tecnologia no estado da arte requer proximidade com grupos de pesquisa de ponta, que o país necessita de soluções sustentáveis para seus baixos níveis de produtividade e que o crescimento possibilitado pela Inteligência Artificial reduzirá o número de anos necessários para a economia da América Latina dobrar de tamanho. Além disso, provocou os convidados com algumas previsões de Ruy Kurzwell, dentre as quais a de que em 2099 os seres humanos serão minoria de forma inteligente na Terra.