06/03/2018
O Decreto Federal nº 9.283, de 7 de fevereiro de 2018, que regulamentou a lei nº 13.243, de 11 de janeiro de 2016, foi recebido pela comunidade acadêmica e empresarial como “um passo importante” para aproximar instituições científicas e tecnológicas (ICTs) e o setor produtivo, aumentar as chances de o conhecimento chegar às empresas e alavancar o desenvolvimento econômico e social.
“O novo marco legal da Ciência, Tecnologia e Inovação (C,T&I) reconhece que ciência e tecnologia são atividades de risco e foca nos resultados, não nos procedimentos”, afirma Helena Nader, ex-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). “O decreto é relevante, com o melhor formato possível”, diz Zaira Turchi, presidente do Conselho das Fundações de Amparo à Pesquisa (Confap) e presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa de Goiás.
“Os atores do ecossistema de inovação terão mais segurança jurídica porque a regulamentação definiu orientações mínimas para a cooperação entre ICTs e o setor produtivo”, comenta Gianna Sagazio, superintendente nacional e diretora de Inovação do Instituto Euvaldo Lodi (IEL) da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
“O decreto desburocratiza o ambiente de pesquisa e, no âmbito dos estados, tem interface com as encomendas tecnológicas”, observa Francilene Garcia, presidente do Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de Ciência, Tecnologia e Inovação (Consecti) e secretária executiva de Ciência e Tecnologia do Estado da Paraíba.
O decreto que regulamenta a lei dispõe sobre estímulos ao desenvolvimento científico e tecnológico e altera artigos de outras quatro, incluindo a Lei nº 8.666: em seu artigo nº 61, por exemplo, dispensa de licitação a contratação de obras e serviços de engenharia enquadrados como produtos para pesquisa e desenvolvimento.
“O novo marco legal é o resultado de uma criação coletiva, que levou dois anos para ser confeccionado. Enquanto a lei nº 13.243 tem 18 artigos, o decreto que a regulamenta tem 86, com o objetivo de clarear e oferecer segurança jurídica aos atores do sistema”, afirma Alvaro Prata, secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).
O decreto autoriza, por exemplo, as instituições públicas a ceder diretamente a empresas o uso de imóveis para a instalação de “ambientes promotores da inovação” – parques tecnológicos, aceleradoras, entre outros –; flexibiliza as regras de transferência de tecnologia de ICTs para o setor privado; e possibilita que as instituições públicas participem minoritariamente do capital da empresa, de forma direta ou indireta, por meio de fundos de investimentos constituídos com recursos próprios ou de terceiros, entre outras medidas.
“Se uma universidade tem determinada tecnologia, pode entrar como sócia de um empreendimento disposto a levá-la ao mercado”, exemplifica Jorge Campagnolo, diretor do Departamento de Políticas e Programas de Apoio à Inovação do MCTIC.
Também amplia mecanismos de subvenção a micro, pequena e média empresas, implantando, entre outras medidas, o bônus tecnológico, destinado ao pagamento de contratação de serviços tecnológicos; além de autorizar que a subvenção econômica possa ser utilizada pelas empresas tanto para o financiamento de atividades de pesquisa como para despesas de capital.
“Alguns entraves foram solucionados pelo marco legal e ratificados pela regulamentação”, afirma a diretora de Inovação do IEL/CNI, citando a possibilidade de o Estado contratar diretamente ICTs ou empresas para a realização de atividades de pesquisas, desenvolvimento e inovação (P,D&I).
“Outro ganho importante é a isenção ou redução do imposto de importação para empresas na execução de projetos”, disse Sagazio, embora lamente o veto presidencial ao artigo da lei nº 13.243 que previa a igualdade entre ICTs e empresas no que diz respeito a essa questão.
Francilene Garcia, presidente do Consecti, espera que o governo reexamine alguns dos oito vetos à lei nº 13.243, demonstrando assim a mesma disposição “ao diálogo propositivo” que pautou os debates sobre o decreto. Um desses vetos, ela menciona, distinguiu instituições privadas e públicas no que diz respeito à concessão e isenção de impostos sobre bolsas. “Bolsas são um direito de qualquer cidadão, esteja ele vinculado a instituições públicas ou privadas”, argumenta.
Representantes da academia, do setor público e das empresas temem, no entanto, que a “burocracia” coloque entraves que, na avaliação de Sagazio, “só serão notados no dia a dia da aplicação da nova lei”.
Turchi preocupa-se com a “interpretação” que os órgãos de controle farão da nova lei. “Há questões que constam em lei há 10 anos. Se os tribunais e órgãos de controle não entenderem e não assimilarem as mudanças, as instituições ficarão reféns de interpretações. E esse é um ponto crucial. O rigorismo do controle contamina também as universidades, e os pesquisadores acabam tendo que dedicar parte do tempo de pesquisa para lidar com questões que não são de fundo”, disse.
(Agência FAPESP)