07/08/2017
A edição de ontem (06/08) da Folha de S. Paulo trouxe no caderno Mercado uma reportagem especial que expõe a queda preocupante do investimento em inovação, por parte do setor publico e também do privado. Na matéria o vice-diretor da Anpei, Luiz Mello, foi uma das fontes especialistas convidadas a discutir.
Mello argumentou que um dos maiores impactos da falta de recursos para a inovação é a baixa competitividade, já que empresas estrangeiras que seguem inovando conseguem desenvolver novos produtos, novos processos e podem abocanhar uma fatia grande do mercado, deixando as empresas nacionais para trás.
A reportagem aponta que o problema está em quase todos os setores, já que os recursos não reembolsáveis que vinham do governo secaram em consequência da dificuldade orçamentária e a concessão de crédito perdeu força por conta da capacidade de pagamento das empresas.
Veja abaixo a matéria na íntegra
Crédito público para a inovação despenca 39%
O apoio do setor público à inovação vem perdendo força como resultado da crise.
De um lado, recursos não reembolsáveis direcionados à inovação minguaram como consequência da dificuldade orçamentária do governo. De outro, a demanda e a concessão de crédito para inovação perderam força com a queda da capacidade de pagamento das empresas.
No BNDES, houve recuo de 39% nos empréstimos para financiar inovação entre 2015 e 2016, de R$ 6 bilhões para R$ 3,6 bilhões.
A tendência seguiu no primeiro semestre de 2017, quando a redução foi de 21% em relação ao mesmo período no ano anterior, para R$ 1 bilhão.
O banco atribui a queda à crise econômica e destaca que a redução dos desembolsos para inovação segue em ritmo semelhante ao das demais linhas de crédito do banco. O BNDES destaca que o desembolso para inovação foi de 0,4% dos empréstimos em 2009 para 4% em 2016.
A Finep, agência financiadora de projetos ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, enfrenta situação dúbia.
De um lado, o FNDCT (Fundo Nacional para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico), administrado por ela, teve 85% de seus recursos contingenciados em 2017.
Em 2017, só não foram contingenciados R$ 620 milhões dos R$ 3,7 bilhões arrecadados pelo FNDCT (que recebe percentuais do faturamento de diferentes setores).
O fundo responde por ações como subvenção a projetos de inovação empresarial, investimento em infraestrutura de laboratórios e concessão de bolsa a pesquisadores.
Marcos Cintra, presidente da agência, afirma que o valor será usado praticamente apenas para pagamento de contratos já firmados. Não será possível usar dinheiro dos fundos para novas chamadas para subvenção de projetos, e programas de bolsas para pesquisa serão prejudicados.
“Estamos praticamente sucateando a área de ciência e tecnologia. Se seguirmos da forma como as coisas estão, vamos perder o investimento feito nos últimos 30 anos.”
A pasta da Ciência e Tecnologia diz que tenta reverter os contingenciamentos.
BAIXA DEMANDA
Por outro lado, a Finep possui recursos próprios, que deveriam ser emprestados para projetos inovadores de empresas. Sua meta era emprestar R$ 2,2 bilhões neste ano, mas foram contratados apenas R$ 400 milhões até o dia 21 de julho, reflexo da baixa demanda das empresas durante a crise.
Segundo especialistas, a perda de recursos para inovação impacta a retomada econômica. Roberto Nicolsky, diretor-geral da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica (Protec), diz que a subvenção às empresas é o melhor mecanismo para incentivar a inovação.
Isso porque trabalhar com o novo envolve investimentos de longo prazo e grande incertezas e riscos, que nem sempre empresas estão dispostas a correr sozinhas.
Por isso, Nicolsky diz que esse risco deve ser compartilhado com o Estado, pois ele seria beneficiário dos projetos que derem certo com aumento de arrecadação.
Para Luiz Mello, vice-presidente da Anpei (Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras), o principal impacto da falta de recursos para inovação está na competitividade das empresas:
“O investimento em inovação visa o lançamento de produtos no mercado. Se deixo de fazer isso e meu concorrente estrangeiro faz, estou perdendo uma fatia para ele.”
PROGRAMA DE INVESTIMENTO
A Finep vem buscando alternativas para investir recursos que possui em caixa, mas não consegue emprestar para empresas em virtude da crise.
A agência lançou em 2017 programa para investir R$ 50 milhões por ano em start-ups.
Também há a ideia de lançar mecanismos para emprestar recursos a empresas que queiram contratar institutos de pesquisa, a partir de linhas com juros menores e prazos mais longos, diz Marcos Cintra, presidente da Finep.
Outra iniciativa destacada por Cintra é ampliar a regionalização da instituição a partir da abertura de mais unidades.
A Finep abriu escritório em Fortaleza neste ano e prevê ter unidades no Centro-Oeste e nas Regiões Sul e Norte ainda em 2017.
Em relação aos contingenciamentos do FNDCT, Cintra defende uma mudança em sua constituição jurídica que garanta que, mesmo que contingenciamentos sejam feitos, os recursos continuem vinculados a Finep e rendendo juros, e não a uma conta do Tesouro Nacional.
“Hoje o fundo não é propriamente um fundo, apesar do nome. Ele recebe determinado valor todo ano e o que sobra não fica com ele, mas é transferido para o caixa do Tesouro.”
A mudança pode ser feita a partir de Medida Provisória do governo federal, diz.
Cintra também diz que estuda medidas que possam baratear o custo de captação de recursos da Finep e, com isso, diminuam as taxas de juros dos empréstimos que a agência faz (atualmente soma da TJLP, hoje em 7% ao ano, mais de 1,5% a 5% ao ano).
O BNDES aponta que, apesar da queda nos empréstimos destinados a projetos de inovação, possui outros mecanismos de apoio ao setor.
Entre os instrumentos estão fundos mútuos fechados e participação direta para promoção de inovação e empreendedorismo.
Atualmente,o banco é cotista em 14 fundos direcionados ao apoio a empresas inovadoras, com investimentos em mais de 174 empresas.
Também há um edital aberto para a seleção do primeiro fundo brasileiro de venture debt, que emprestará recursos para companhias inovadoras que ainda não possuem faturamento que as permita tomar crédito, mas que tenham grande potencial de crescimento.