A ANPEI – Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras, entidade de natureza associativa que representa mais de 250 associados que realizam pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovação (P,D&I) no país, vem se manifestar sobre a Proposta de Emenda Constitucional 187/2019, em tramitação neste Congresso.
A referida PEC 187 está inserida no Plano Mais Brasil, que cria mecanismos de controle das contas públicas da União, dos estados e municípios, objetiva dar sustentabilidade aos gastos e investimentos públicos, bem como dar racionalidade aos inúmeros fundos existentes e destinação de recursos a atividades que a sociedade realmente precisa.
Como entidade representativa das empresas inovadoras a ANPEI vem trazer considerações a respeito da medida, em especial no que diz respeito aos fundos FNDCT – Fundo Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação e aos fundos setoriais.
Concordamos com as justificativas relativas aos ganhos de racionalidade e à necessidade de avaliação da eficácia dos instrumentos de fomento. Estamos realizando estudos para contribuir com o governo e a sociedade brasileira na sua avaliação e na proposição de uma nova geração de instrumentos que fomentem P,D&I, na certeza de que são atividades essenciais para uma sociedade justa e próspera.
Entendemos, entretanto, que tais medidas não podem ser circunstanciais e isoladas. Devem fazer parte das discussões relacionadas às necessárias reformas do Estado, à reforma tributária e à Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, sob o risco de gerarem distorções e contradições para o desenvolvimento nacional, afetando uma atividade imprescindível para o futuro do país como a Ciência, Tecnologia e a Inovação.
O FNDCT e os fundos setoriais têm papel histórico no desenvolvimento da Ciência aplicada no Brasil e têm sido as únicas fontes de oferta de recursos não reembolsáveis para a atividade. A descontinuidade da destinação de recursos para fomentar Ciência Aplicada, pela desvinculação imediata da fonte ao FNDCT e aos fundos setoriais, causará descontinuidade de relevantes pesquisas e projetos no país, e afetará projetos futuros. P,D&I não se fazem em curto espaço de tempo e sem risco. Governos de todo o mundo compartilham com as universidades e o setor privado o risco inerente ao processo de inovar.
A origem dos recursos do FNDCT e dos fundos setoriais não é pública, mas sim originária de gastos obrigatórios do setor privado, que deveria ter mais liberdade para definir a aplicação dos recursos, reservando a maior parte para mais inovação, para gerar mais riquezas para o país, e vinculando a governança com foco empresarial. Com os grandes contingenciamentos, a aplicação dos recursos não-reembolsáveis tem sido destinada à base da cadeia da inovação, a Ciência. Assim, imaginamos futuros fundos ou parte dos fundos atuais para destinação de mais recursos para a ponta final da cadeia, o desenvolvimento tecnológico e a inovação.
Mais adequado que desvincular imediatamente as fontes ao FNDCT e aos fundos setoriais, seria determinar um prazo de até dois anos para ratificá-los. Na prática, ao criar a desvinculação da receita e não extinguir a obrigatoriedade da arrecadação, a PEC cria desvio de finalidade do superávit financeiro do fundo, pois vincula a receita a destinações distintas da sua criação (pagamento da dívida pública, erradicação da pobreza e investimentos em infraestrutura). Tal observação vale também para os estados e municípios, que serão afetados na sua autonomia de definir políticas de inovação.
A ANPEI concorda com a necessidade de trazer à tona a reflexão sobre a eficácia e efetividade dos fundos, inclusive com possíveis novas alternativas para estímulo ao setor privado – o provedor de recursos dos fundos – em aplicar os recursos em P&D nas atividades que melhor convém à estratégia da empresa.
Defende, pois, o urgente redesenho da política para os fundos. Para tanto, o FNDCT e os fundos setoriais deveriam ser excepcionalizados do texto geral da PEC, que daria um prazo de dois anos para sua avaliação e ajustes. Neste período, com o intuito de contribuir para o equilíbrio das contas públicas, o estoque de recursos já contingenciados poderia ser usado para custear a dívida pública. Entretanto, no interregno de dois anos, a vinculação da destinação para o FNDCT e para os fundos setoriais permaneceria, já que a contribuição para o fundo não se extingue, conforme a intenção da PEC 187.
A ANPEI advoga também por um maior planejamento para os fundos, estabelecido em construção conjunta com suas governanças, definindo as áreas foco de atuação frente aos objetivos nacionais estabelecidos em lei, e alinhados com vocações nacionais, além da participação dos demais ministérios-chave ligados à área de C,T&I, como o Ministério da Economia, Ministério das Relações Exteriores, e do MCTIC.
Os recursos do FNDCT e dos fundos setoriais já têm sido objeto de grandes contingenciamentos ao longo dos últimos anos, afetando as perspectivas de recursos para C,T&I. Dos R$ 4,5 bilhões de recursos arrecadados pelo FNDCT em 2019, R$ 2,7 bilhões foram contingenciados. Espera-se que haja mecanismos constitucionais para garantir aos futuros fundos que não haja mais contingenciamentos ou reservas de contingência, a fim de garantir a necessária estabilidade de recursos para uma atividade tão sensível e arriscada, como ciência e tecnologia.
Cordialmente,
Humberto Pereira
Presidente